março 26, 2020
A pandemia já se consolidou no cenário mundial, trazendo consequências severas para toda a sociedade na contenção dos riscos necessários a salvaguardar a integridade da saúde da população mundial, especialmente o isolamento dos indivíduos no regime de quarentena, assolando a economia em nível sem precedente.
O ordenamento jurídico nacional possui mecanismos destinados a tratar das questões contratuais em contextos imprevisíveis e extremos, estes decorrentes da Teoria da Imprevisão ou do Princípio da Revisão dos Contratos, que permitem a revisão de um contrato sempre que as circunstâncias que envolveram a sua negociação e assinatura não forem as mesmas no momento da execução da obrigação contratual, de forma a causar onerosidade excessiva, esta não coberta objetivamente pelos riscos próprios da contratação.
Em uma análise mais detalhada, três são os elementos essenciais para que seja aplicável a teoria da imprevisão aos contratos:
i – superveniência de um acontecimento imprevisível;
ii – alteração da base econômica objetiva do contrato;
iii – onerosidade excessiva a uma das partes.
O Superior Tribunal de Justiça já decidiu no julgamento do REsp 860.277 o entendimento pela aplicação da teoria da imprevisão extraordinariamente quando o fato não estivesse coberto pelos riscos do contrato, ou seja, quando as partes não previram mecanismos para equalizar a disparidade e desequilíbrio gerados por um fator externo e inconcebível ao tempo da contratação.
Nosso Código Civil estabelece regras para a aplicabilidade da teoria da imprevisão:
Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação.
Art. 479. A resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a modificar equitativamente as condições do contrato.
A recente inovação trazida pelo art. 421-A ao Código Civil, decorrente Lei da Liberdade Econômica (Lei 13.874, de 20 de setembro de 2019), que possibilita a revisão contratual de forma excepcional e limitada reforça a teoria em questão:
Art. 421-A. Os contratos civis e empresariais presumem-se paritários e simétricos até a presença de elementos concretos que justifiquem o afastamento dessa presunção, ressalvados os regimes jurídicos previstos em leis especiais, garantido também que:
( …)
III – a revisão contratual somente ocorrerá de maneira excepcional e limitada.
Como resta acima demonstrado, existem mecanismos legais autorizadores da renegociação de contratos, visando um equilíbrio para todos os lados envolvidos, sendo notória e incontestável a nefasta consequência decorrente do isolamento necessário a conter a pandemia do Covid-19, cabendo aos aplicadores do direito buscarem esta solução o mais breve possível, de forma a evitar um colapso ainda maior, talvez irreversível para a maioria dos empreendedores brasileiros.
Portanto, por mais que toda a preocupação com a saúde seja legítima e necessária neste momento, existe um cenário de grave crise econômico-financeira, para a qual devem ser empregados de forma urgente todos os meios jurídicos possíveis para mitigar danos irreversíveis.
LUIS GUSTAVO NEUBERN é advogado e sócio do NEUBERN E THEODORO ADVOGADOS.